O Senhor Morgado,
vai no seu murzelo
Todo empertigado, é um gosto vê-lo.
Próspero anafado, véstia alentejana,
Calça de riscado, homem duma cana.
Vai, todo se ufana, de ir tão bem montado.
E ela da janela, seja Deus louvado,
Seja Deus louvado,
Seja Deus louvado.
O Sr. Morgado, vai nas próprias pernas
Todo bambeado, tem palavras ternas.
Para cada lado, quando passa sente,
Que é temido e amado, fala a toda a gente.
Topa um influente, sou um seu criado.
Eleições á porta, seja Deus louvado,
Seja Deus louvado,
Seja Deus louvado.
O Sr. Morgado vai na sege rica
Todo repimpado, ai que bem lhe fica.
O Chapéu armado e a comenda ao peito,
E o espadim ao lado, que homem tão perfeito.
Deputado eleito, muito bem votado.
Vai para o Te-Deum, seja Deus louvado,
Seja Deus louvado,
Seja Deus louvado.
O senhor Morgado vai na sege rica
Todo repimpado, ai que bem lhe fica.
O Chapéu armado e a comenda ao peito,
E o espadim ao lado, que homem tão perfeito.
Deputado eleito, muito bem votado,
E ela da janela, eleições à porta
Vai para o Te-Deum,
Seja Deus louvado.
Às vezes há que fazer as chamadas
"leituras úteis" para bem do nosso conhecimento. Este livro publicado
pela Alêtheia Editores é uma dessas leituras. O tema é do interesse geral e o
autor é pura e simplesmente o mais acérrimo defensor da não ratificação do
Acordo Ortográfico por parte do Governo português. Vasco Graça Moura reúne
neste livro as suas principais intervenções e opiniões relativamente ao Acordo
Ortográfico de 1990, todas elas publicadas no jornal "Diário de
Notícias", exceptuando a intervenção do autor na conferência internacional
ocorrida na Assembleia da República a 7 de Abril de 2008.
Trata-se de um livro interessante e
bastante útil que contém em anexo documentos que o autor cita, incluindo as
mudanças que ocorrerão na escrita da língua portuguesa se o acordo for aprovado
por todos os países de língua oficial portuguesa. A ilustração da capa do livro
- uma das mais conhecidas ilustrações do terramoto de 1755 em Lisboa - é
sugestiva e condiz bem com o título do livro e com a opinião do autor. Vasco
Graça Moura justifica sempre com clareza a sua opinião. Um óptimo argumentador,
ou não tivesse ele formação em Direito e exercido advocacia durante vários
anos.
Em linhas gerais, o que Vasco Graça Moura
defende é que não estão reunidas todas as condições para que o acordo
ortográfico seja ratificado. O autor diz mesmo que é
"inconstitucional" ratificar um acordo que não reúne o comum acordo
de todos os PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) e de Timor. O
acordo não deverá ser um assunto tratado apenas por Portugal e pelo Brasil.
Vasco Graça Moura aponta as principais alterações à grafia da língua portuguesa
como um "abrasileiramento". Em pano de fundo poderão estar razões de
interesse económico que beneficiarão claramente o Brasil. A ser ratificado, o
acordo resultará na invalidação de todos os livros em português actualmente
impressos. Os dicionários e gigantescas enciclopédias, bem como os manuais
escolares, ficarão inutilizados. As bibliotecas e escolas terão
"resmas" de livros desactualizados em relação à nova grafia.
"Ação", "ator", "batizar", "Egito" são
exemplos correntes de palavras do português do Brasil que passarão a ser
adoptados em Portugal e restantes países onde a língua portuguesa é a língua
oficial. E quem lucrará com tudo isto? As editoras de livros brasileiras.
Ou seja, Vasco Graça Moura chama a atenção
para o facto do acordo ortográfico provocar confusão na grafia da língua, visto
que há situações em que, por exemplo, no caso das sequências consonânticas: o
"c" e o "p" - «Conservam-se nos casos em que são
invariavelmente proferidos nas pronúncias cultas da língua» e «Eliminam-se nos
casos em que são invariavelmente mudos nas pronúncias cultas da língua» - está
tudo na Base IV do referido acordo ortográfico. Afinal o que são «pronúncias
cultas da língua»? O Português do Brasil? E então o vasto leque de pronúncias
dos PALOP não é tido em consideração?
Se a língua que falamos é a nossa
bandeira, o Governo tem de pesar bem os prós e os contras deste controverso
Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, sob o risco de perdermos uma parte
importante da nossa identidade como povo português. O livro que aqui sugiro é
bastante esclarecedor sobre isso.
Somos filhos da
madrugada
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de quem nos traga
Verde oliva de flor nos ramos
Navegamos de vaga em vaga
Não soubemos de dor nem mágoa
Pelas praia do mar nos vamos
À procura da manhã clara
Lá do cimo de uma montanha
Acendemos uma fogueira
Para não se apagar a chama
Que dá vida na noite inteira
Mensageira pomba chamada
Companheira da madrugada
Quando a noite vier que venha
Lá do cimo de uma montanha
Onde o vento cortou amarras
Largaremos p'la noite fora
Onde há sempre uma boa estrela
Noite e dia ao romper da aurora
Vira a proa minha galera
Que a vitória já não espera
Fresca, brisa, moira encantada
Vira a proa da minha barca.
Cheguei ao fundo
da estrada,
Duas léguas de nada,
Não sei que força me mantém.
É tão cinzenta a Alemanha
E a saudade tamanha,
E o verão nunca mais vem.
Quero ir para casa
Embarcar num golpe de asa,
Pisar a terra em brasa,
Que a noite já aí vem.
Quero voltar
Para os braços da minha mãe,
Quero voltar
Para os braços da minha mãe.
Trouxe um pouco
de terra,
Cheira a pinheiro e a serra,
Voam pombas
No beiral.
Fiz vinte anos no chão,
Na noite de Amsterdão,
Comprei amor
Pelo jornal.
Quero ir para casa
Embarcar num golpe de asa,
Pisar a terra em brasa,
Que a noite já aí vem.
Quero voltar
Para os braços da minha mãe,
Quero voltar
Para os braços da minha mãe.
Vim em passo de
bala,
Um diploma na mala,
Deixei o meu amor p'ra trás.
Faz tanto frio em Paris,
Sou já memória e raiz,
Ninguém sai donde tem Paz.
Quero ir para casa
Embarcar num golpe de asa,
Pisar a terra em brasa,
Que a noite já aí vem.
Quero voltar
Para os braços da minha mãe,
Quero voltar
Para os braços da minha mãe.
"Sinto
muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo
governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar – se possível –
judeus, o gentio... negros... brancos.
Todos nós
desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Queremos viver
pela felicidade dos outros, não pela miséria dos outros. Por que havemos de
odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra,
que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades.
O caminho da
vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça
envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e
tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos
a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina,
que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos
fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia
e sentimos bem pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais
do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a
vida será de violência e tudo será perdido.
A aviação e o
rádio aproximaram-nos muito mais. A própria natureza dessas coisas é um apelo
eloqüente à bondade do homem... um apelo à fraternidade universal... à união de
todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhares de pessoas pelo
mundo afora... milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas...
vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes. Aos que
me podem ouvir eu digo: “Não desespereis! A desgraça que tem caído sobre nós
não é mais do que o produto da cobiça em agonia... da amargura de homens que
temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os
ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E
assim, enquanto morrem homens, a liberdade nunca perecerá.
Soldados! Não
vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... que vos escravizam...
que arregimentam as vossas vidas... que ditam os vossos atos, as vossas idéias
e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem
a uma alimentação regrada, que vos tratam como gado humano e que vos utilizam
como bucha de canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da
humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar...
os que não se fazem amar e os inumanos!
Soldados! Não
batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de
São Lucas está escrito que o Reino de Deus está dentro do homem – não de um só
homem ou grupo de homens, mas dos homens todos! Está em vós! Vós, o povo,
tendes o poder – o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o
povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... de fazê-la uma
aventura maravilhosa. Portanto – em nome da democracia – usemos desse poder,
unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo... um mundo bom que a todos assegure
o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.
É pela
promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só mistificam!
Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém
escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras
nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de
razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós.
Soldados, em nome da democracia, unamo-nos! ( segue o estrondoso aplauso da multidão ).
Então,
dirige-se a Hannah :
Hannah, estás
me ouvindo? Onde te encontrares, levanta os olhos! Vês, Hannah? O sol vai
rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz! Vamos
entrando num mundo novo – um mundo melhor, em que os homens estarão acima da
cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergue os olhos, Hannah! A alma do homem
ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da
esperança. Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos!."
[…] Os artigos que lemos nos jornais falam
sempre de percentagens da população em “risco de pobreza” mas trata-se de um
eufemismo. É um eufemismo que a terminologia oficial impôs, que as estatísticas
usam e que os próprios investigadores aceitaram, mas é um vergonhoso eufemismo.
Estes dois milhões de portugueses que não conseguem pagar transportes para ir
trabalhar, que não conseguem dar refeições decentes aos seus filhos, que não
têm dinheiro para comprar manuais escolares, que não têm dinheiro para pagar
uma consulta num hospital público, que não conseguem aquecer a casa no Inverno,
que se escondem à hora de almoço porque nem sequer podem levar para o local de
trabalho uma marmita com sopa, não correm “risco de pobreza”. São mesmo pobres.
Porquê então o “risco”? Porque é do interesse dos poderes suavizar a expressão
para se desresponsabilizarem da situação, para poderem negar a sua extensão e
para reduzir o impacto social das estatísticas. […]
[…] Custa,
portanto, a compreender o que leva um vice-primeiro-ministro [Paulo Portas] a
convocar os partidos com assento parlamentar para discutir a magna questão da
reforma do Estado, para depois se sentar frente-a-frente com as delegações
daqueles partidos com o guião da reforma do Estado que apresentou no final de
2013 na mesa, um sorriso e nada de novo para dizer. […]
“Isto significa
que este Governo e este primeiro-ministro não jogam limpo com os portugueses;
que este primeiro-ministro não mostra toda a verdade aos portugueses, que este
primeiro-ministro não tem respeito pelos portugueses”.
“Nós podemos
concordar ou discordar da governação. O que não se pode aceitar é que haja um
Governo e um primeiro-ministro que governa mentindo aos portugueses. E a
palavra é mesmo mentir aos portugueses, enganar os portugueses”, criticou o
líder socialista. Mais: “Hoje quando lhe disseram ‘esclareça os portugueses’, o
que fez o primeiro-ministro? Fugiu e não deu qualquer esclarecimento”.
*amuo
Manifestação de enfado ou de mau humor que
se revela por gestos,
por um silêncio obstinado ou por se evitar olhar para o
seu causador.
"amuo",
in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa online, 2008-2013
O álbum “SONHO COM ASAS”, das portuguesas Fátima
Afonso e Maria Teresa Martinho Marques, foi finalista [equivalente ao 2.º lugar entre 255 trabalhos de 21 países].
Já aqui falei do minimercado Pérola dos Açores pertença do simpático casal Mina e Hélder. Ela teve a
gentileza de nos mostrar fotografias tiradas na Índia aquando do casamento do
irmão. Não resisti a pedir-lhe autorização para publicar duas delas.
Alexandra Lucas Coelho, PÚBLICO-Online, 09.Abril.2014
A autora recebeu na passada 2.ª feira o prémio APE pelo romance E a Noite Roda.
O que se segue é um excerto do discurso que fez, no qual critica o actual poder político.
[...] Este prémio é tradicionalmente entregue pelo Presidente da República, cargo
agora ocupado por um político, Cavaco Silva, que há 30 anos representa tudo o
que associo mais ao salazarismo do que ao 25 de Abril, a começar por essa vil
tristeza dos obedientes que dentro de si recalcam um império perdido.
E fogem ao cara-cara, mantêm-se pela calada. Nada estranho, pois, que este
Presidente se faça representar na entrega de um prémio literário. Este mundo
não é do seu reino. Estamos no mesmo país, mas o meu país não é o seu país. No
país que tenho na cabeça não se anda com a cabeça entre as orelhas, “e cá vamos
indo, se deus quiser”.
Não sou crente, portanto acho que depende de nós mais do que irmos indo,
sempre acima das nossas possibilidades para o tecto ficar mais alto em vez de
mais baixo. Para claustrofobia já nos basta estarmos vivos, sermos seres para a
morte, que somos, que somos.
Partimos então do zero, sabendo que chegaremos a zero, e pelo meio tudo é
ganho, porque só a perda é certa.
O meu país não é do orgulhosamente só. Não sei o que seja amar a pátria.
Sei que amar Portugal é voltar do mundo e descer ao Alentejo, com o
prazer de poder estar ali porque se quer. Amar Portugal é estar em Portugal
porque se quer. Poder estar em Portugal apesar de o Governo nos mandar embora.
Contrariar quem nos manda embora como se fosse senhor da casa.
Eu gostava de dizer ao actual Presidente da República, aqui representado
hoje, que este país não é seu, nem do Governo do seu partido. É do arquitecto
Álvaro Siza, do cientista Sobrinho Simões, do ensaísta Eugénio Lisboa, de todas
as vozes que me foram chegando, ao longo destes anos no Brasil, dando conta do
pesadelo que o Governo de Portugal se tornou: Siza dizendo que há a sensação de
viver de novo em ditadura, Sobrinho Simões dizendo que este Governo rebentou com
tudo o que fora construído na investigação, Eugénio Lisboa, aos 82 anos,
falando da “total anestesia das antenas sociais ou simplesmente humanas, que
caracterizam aqueles grandes políticos e estadistas que a História não confina
a míseras notas de pé de página”. [...]
Durão Barroso diz
que, quando era primeiro-ministro, chamou três vezes o governador do Banco de
Portugal a São Bento, “para saber se aquilo que se dizia do BPN era verdade”.
Não sabemos o que era então “aquilo”, mas sabemos que Vítor Constâncio, em
resposta ao actual candidato a candidato à Presidência da República, disse duas
coisas: que “nunca recebeu qualquer informação sobre possíveis irregularidades
concretas no BPN” da parte de Durão Barroso e que não recordava “qualquer
convocação exclusivamente sobre o BPN" feita pelo então primeiro-ministro.
É estranho o
“exclusivamente”. Somos obrigados a pensar que Constâncio se lembra
perfeitamente de três convocações do primeiro-ministro onde o BPN constava na
agenda como tema a tratar só que... não era o ponto único da reunião. Assim, a
declaração de Constâncio não desmente frontalmente o ex-primeiro-ministro. De
facto, por muito importante que fosse a girândola de fraudes do BPN, seria
natural que o governador do banco central e o primeiro-ministro tivessem tido
pelo menos duas coisas para discutir numa reunião, e a expressão de Constâncio
faz-nos pensar que foi precisamente isso que aconteceu. Mas o facto de Durão
Barroso ter sido propositadamente vago também nos sugere que o PM não deverá
ter dito nem perguntado a Constâncio nada de substantivo e até sugere que a
conversa que terá mantido com o governador do Banco de Portugal terá sido num
registo casual. “Ó Constâncio, o que me diz daquilo que se diz p'raí do BPN?” “Estamos atentos, senhor primeiro-ministro. Tomaremos as diligências que nos
parecerem adequadas.” “Ah, bom. Assim, fico descansado.”
[…]
Há, em toda esta
história, outra coisa que não se percebe. Como é possível que Durão e
Constâncio possam contar estas histórias de forma tão imprecisa, baseando-se na
sua memória? A Presidência do Conselho de Ministros não guarda registos? O
Banco de Portugal não guarda registos? As reuniões não dão origem a actas? Nos
Estados Unidos, uma história destas teria trinta memos escritos a sustentá-la,
sete actas de reuniões, as agendas de todos os participantes, entradas nos
diários dos intervenientes, dias e horas das reuniões e respectivas ordens de
trabalhos, registos do que se disse e do que foi pedido e do que foi garantido
e por quem.
Mas em Portugal,
no meio político, a regra é a informalidade e isso é apresentado como um sinal
dos nossos brandos costumes. O problema é que a informalidade é a arma de
eleição dos corruptos e dos aldrabões. Os políticos não têm agendas, as
reuniões não têm actas, as declarações não têm testemunhas. E, nos raros casos
em que esses documentos existem, os protagonistas levam-nos para casa no fim da
legislatura como se fossem propriedade sua e não património público e um
elemento essencial da responsabilização dos agentes políticos.
Perante esta nova
e súbita paixão de Passos “Que Se Lixem as Eleições” Coelho pelo aumento do
salário mínimo nacional, convinha o Partido Socialista fazer uma adenda ao seu
óptimo vídeo do dia 1 de Abril, onde elencava uma série de promessas feitas
pelo líder do PSD antes das legislativas de 2011, tais como: “é um disparate acabar com o 13.º mês”; “não contarão connosco para mais ataques à classe média
em nome dos problemas externos”; “não olhamos para as classes de rendimentos a
partir dos mil euros dizendo ‘aqui estão os ricos, eles que paguem a crise’”;
“é absolutamente falso querer acabar com a taxa intermédia de IVA para a
restauração”; “não é para fazer mais aumentos de impostos”; “como primeiro-ministro,
recuso-me a cortar salários”; e por aí fora.
Tudo isto Pedro
Passos Coelho prometeu, e tudo isto Pedro Passos Coelho incumpriu. Se lhe
perguntarem porquê, ele dirá o mesmo que todos dizem – que não sabia, que não
estava à espera que o estado das contas públicas fosse tão grave, que não
queria, que ficou muito triste, que teve mesmo de ser, como se a admissão da
ignorância em tempo de campanha eleitoral fosse justificável, como se não fosse
obrigação de um partido com ambições de poder ter a perfeita consciência do
estado em que o país se encontra. [...]
Diz-me se é
difícil
Carregar a própria sombra,
Virar a proa na maré
Por mais alta seja a onda,
Ser inteiro e estar de pé,
Sentir o bem quando te ronda,
Diz-me se é difícil
Carregar a própria sombra.
Diz-me o que
dirias
Se Deus te aparecesse,
Que segredos guardarias
Se a mão na mão lhe desses,
Se Ele chorar contigo
Porque fim te apetece,
Diz-me o que dirias Se Deus te aparecesse.
Haja cidades
Que te sirvam de abrigo,
Por toda a parte
Gente que quer ir contigo,
Só há lugar
Para os que riem do perigo,
São tantos os que pedem e que dizem:
Hoje é o teu dia,
Hoje é o teu dia,
...
É tempo de
arranjar
20 segundos de coragem,
De passar o rio a vau
Mudar o rumo da viagem,
Bater todas as portas
Beber do fundo da miragem,
É tempo de arranjar
20 segundos de coragem.
Diz-me se tens
medo
Por quem perdes no caminho,
Das noites desgarradas,
De mais um dia sozinho,
A vida pode ser
Como veludo ou azevinho,
E diz-me se tens medo
Por quem perdes no caminho.
Haja cidades
Que te sirvam de abrigo,
Por toda a parte
Gente que quer ir contigo,
Só há lugar
Para os que riem do perigo,
São tantos os que pedem e que dizem:
Hoje é o teu dia,
Hoje é o teu dia,
...
Já não há noite
Onde esta luz não se ouça,
Não há lugar
Sem a loucura da dança,
E há tantas vozes
Todas diferentes,
Cada vez mais perto
O que grita toda a gente:
Definitivo não é extraordinário. Extraordinário não é
definitivamente ordinário. Mas o ordinário não é sinónimo de temporário. Pode
significar até excepcional. Tão repetidamente excepcional que até pode ser
permanente. Ainda que passe por ser transitório, o que não significa
necessariamente anual. Mas, mesmo assim, especial.
Tudo isto à volta de cortes. Ou de poupanças, o (novo)
nome do aumento de impostos ou do seu equivalente algébrico do lado da despesa.
Cortes que só por si vêm sendo também sinónimo de reforma do Estado. […]
Nada exclusivo de Portugal, diga-se em abono da verdade. A
política e a Europa foram tomadas por uma vaga de palavras, um quase dialecto,
incompreensível para os comuns mortais. Há quem faça gala em usar termos que
nada dizem, mas que impressionam ou dissimulam a vacuidade. Desde a famosa geometria variável, à narrativa, temática e problemática, sinergia e imparidade, ao alocar, agilizar, alavancar e customizar,
ao efeito já descontado em sede de
qualquer coisa, ao disfuncional
resiliente, etc.
Como disse Florbela Espanca, “tão pobres somos que as
mesmas palavras nos servem para exprimir a verdade e a mentira”.