(Público, 01.Fev.2014)
«[...] Não é por isso de estranhar
que os actuais governantes não tenham nenhum problema em usar os discursos de
divisão social, em que se especializaram quando do “discurso geracional”. A
frase da moção de Passos Coelho sobre a “apropriação excessiva dos direitos
das gerações futuras por parte das actuais gerações” é prenhe de significado
político e ideológico, mas deve ser combatida sem transigências. É má no plano
político e falsa no seu conteúdo. Quem define o que é “excessivo”? Como se pode
arrogar de “defender” os “jovens” quem degrada as suas condições de vida
actual, inclusive ao atirar os seus pais e avós para a pobreza, e quem
empurrando-os para o desemprego, a emigração ou para a precariedade, lhes
estraga o presente e o futuro? E que “futuro” vão ter, sendo menos qualificados
e com salários mais baixos, “ajustados”? É retórica que usa a juventude para
garantir uma nova hierarquia social de poder, mas nada mais do que isso.
Mas não é só isso. A frase
também é má no plano da moralidade social, gera gente má e indiferente aos
estragos que faz na vida alheia, gente que perante qualquer problema tende a de
imediato culpabilizar sempre os mais fracos, e assenta no uso do poder do
Estado para atacar quem tem pouca defesa e nenhum recuo no meio ou no fim da
vida. Até porque a juventude defende sempre os mais jovens, dá-lhes mais mobilidade
e oportunidades, por poucas e difíceis que sejam, e a idade adulta, que é a do
“desemprego de longa duração” e a da velhice, que é a dos cortes nas reformas e
pensões, essas não dão oportunidade nenhuma. Para eles, não há “impulso”
nenhum, são aqueles para quem existe apenas uma sanção moral pelo seu “culto
da gratificação imediata e da consideração de curto prazo em desfavor da
reflexão prospectiva”. Este é o produto de gente mal formada, como se dizia
antigamente. Linguagem do passado, bem sei, sem “reflexão prospectiva”.»
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