sábado, 4 de maio de 2013

Pior do que há dois anos...


«[…] Há dois anos, o ministro das Finanças de Sócrates, para impor o resgate externo, mandou o recado para os jornais de que não havia dinheiro para salários e pensões. Esta semana, o primeiro-ministro, Passos Coelho, veio dizer o mesmo: ou prosseguimos as políticas que ele propõe, ou não há dinheiro para salários e pensões. Descontando o elemento chantagista do argumento, que é igual há dois anos e hoje, o que podemos concluir é que nada foi adquirido e que estamos na mesma, vivemos a um mês de não ter dinheiro para salários e pensões.

Se se aceita a veracidade do argumento, a pergunta a fazer é que significado teve o sacrifício dos portugueses nestes dois anos, em que cada pacote de austeridade foi sempre apresentado como último, para ser logo a seguir anunciado um novo, quando o Governo não conseguia os resultados que pretendia com o anterior. Em finais de 2011, Passos Coelho, quando questionado sobre se bastava o corte de meio subsídio de Natal, respondeu que sim. Logo a seguir, quando do anúncio do fim dos subsídios de Natal e de férias, quando questionado sobre se era suficiente, respondeu que sim. Em 2012, quando subiram os impostos, questionado sobre se chegava, Passos Coelho respondeu que sim. Em 2012, quando anunciada a subida da TSU, questionado sobre se essa medida seria eficaz, Passos Coelho respondeu que sim. Em 2012, quando se anunciou o “enorme aumento de impostos”, que seria apenas para 2013, Passos Coelho garantiu que sim. Em 2012 e 2013, quando começou a falar da “refundação do Estado” e dos quatro mil milhões, questionado sobre se isso resolvia o problema de adequar o financiamento do Estado aos recursos que os “portugueses estariam dispostos a pagar”, Passos Coelho respondeu que sim, esta reforma era “estrutural” e por isso fechava o “problema”.

A cada pacote de austeridade foi sempre pedido mais do que no pacote anterior e todas as medidas estão a ser cumulativas, e as que eram provisórias para 2011, 2012, ou 2013 continuam em aplicação para 2014, 2015, 2016, 2017, e algumas o ministro das Finanças aponta para 2020-2030. De medidas destinadas a resolver a situação de emergência de 2011-2014, passaram a medidas para uma geração ou duas. Qualquer pessoa que tenha uma mínima ideia do que é uma democracia percebe que isto é errado, ilusório, mágico, milagroso, ou melhor ainda, um completo disparate. […]»

José Pacheco Pereira
Pior do que há dois anos – primeiro acto
PÚBLICO, 04.Maio.2013 (p.52)

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