«[…] Há dois
anos, o ministro das Finanças de Sócrates, para impor o resgate externo, mandou
o recado para os jornais de que não havia dinheiro para salários e pensões.
Esta semana, o primeiro-ministro, Passos Coelho, veio dizer o mesmo: ou prosseguimos
as políticas que ele propõe, ou não há dinheiro para salários e pensões. Descontando
o elemento chantagista do argumento, que é igual há dois anos e hoje, o que
podemos concluir é que nada foi adquirido e que estamos na mesma, vivemos a um
mês de não ter dinheiro para salários e pensões.
Se se aceita a
veracidade do argumento, a pergunta a fazer é que significado teve o sacrifício
dos portugueses nestes dois anos, em que cada pacote de austeridade foi sempre
apresentado como último, para ser logo a seguir anunciado um novo, quando o
Governo não conseguia os resultados que pretendia com o anterior. Em finais de
2011, Passos Coelho, quando questionado sobre se bastava o corte de meio
subsídio de Natal, respondeu que sim. Logo a seguir, quando do anúncio do fim
dos subsídios de Natal e de férias, quando questionado sobre se era suficiente,
respondeu que sim. Em 2012, quando subiram os impostos, questionado sobre se
chegava, Passos Coelho respondeu que sim. Em 2012, quando anunciada a subida da
TSU, questionado sobre se essa medida seria eficaz, Passos Coelho respondeu que
sim. Em 2012, quando se anunciou o “enorme aumento de impostos”, que seria
apenas para 2013, Passos Coelho garantiu que sim. Em 2012 e 2013, quando começou
a falar da “refundação do Estado” e dos quatro mil milhões, questionado sobre se
isso resolvia o problema de adequar o financiamento do Estado aos recursos que
os “portugueses estariam dispostos a pagar”, Passos Coelho respondeu que sim, esta
reforma era “estrutural” e por isso fechava o “problema”.
A cada pacote de
austeridade foi sempre pedido mais do que no pacote anterior e todas as medidas
estão a ser cumulativas, e as que eram provisórias para 2011, 2012, ou 2013
continuam em aplicação para 2014, 2015, 2016, 2017, e algumas o ministro das
Finanças aponta para 2020-2030. De medidas destinadas a resolver a situação de emergência
de 2011-2014, passaram a medidas para uma geração ou duas. Qualquer pessoa que
tenha uma mínima ideia do que é uma democracia percebe que isto é errado, ilusório,
mágico, milagroso, ou melhor ainda, um completo disparate. […]»
José Pacheco Pereira
Pior
do que há dois anos – primeiro acto
PÚBLICO, 04.Maio.2013 (p.52)
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