Rui Cardoso Martins
P2, Público, 24.Maio.2015
(…)
Passos Coelho pretende afirmar-se como uma espécie nova de político
providencial — é isso que o livro faz com tantas mistificações do seu percurso
de vida, tantas omissões do verdadeiro papel de aliados agora inconvenientes
(Miguel Relvas, Ângelo Correia, despachados numa frase). Honrado, verdadeiro,
transparente, apesar das “imperfeições”. Como a história muito mal explicada do
que fazia e ganhava na Tecnoforma e a quantidade de anos em que foi trânsfuga
da Segurança Social, de 1999 a 2004, os “anos em que este cidadão foi mais
imperfeito” (pág. 136).
(…)
Mas vivemos num momento da política em que
verdade e mentira deixaram de ser opostas. Aliás, nem lutam uma contra a outra.
Não faz qualquer diferença. Só conta o efeito imediato, amanhã logo se vê. Mas
a mentira é insidiosa e fura a verdade como a água fura a pedra e deixa um
buraco. É por isso que é possível ler neste livro, de várias formas, a frase do
sr. Cardoso, dono do restaurante Comilão, “o Pedro diz sempre a verdade” (pág.
84), omitindo a lista de promessas falsas que Passos Coelho fez para ganhar as
eleições, a começar pela garantia de que nunca iria cortar salários porque isso
era “um disparate”.
(…)
Esta figura opaca que mistura família e
política negando fazê-lo acaba de lançar novas bases populares para a conquista
das próximas eleições. Para a manutenção no poder. Ingénua, mal feita, a
biografia quer construir um novo mito português.
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