domingo, 14 de agosto de 2011

Sistemas educativos e Inteligências

Com pouco mais de dois anos era fácil perceber que tinha uma predilecção por animais. Pois se até colocava a comida no chão para a comer como um deles… Mais tarde veio o fascínio pelas séries televisivas da selva e de novo… os animais, colecções de cromos, desenhos com animais… e nunca ninguém duvidou que essa seria a sua “via”. Hoje, é veterinário, tendo sido um premiado estudante.


No entanto, quem visite a sua casa, perceberá que há outra vida que foi emergindo paralela a esta escolha tão precoce, vida que surgiu tardiamente com cerca de 40 anos. Centenas de esculturas em madeira e outros materiais da natureza povoam todos os cantos da casa, contando mil histórias que revelam uma fantasia inesgotável e a inevitabilidade de transpor para o exterior mundos interiores. Fá-lo também através do desenho onde a profusão de elementos, o cromatismo exuberante e o aspecto labiríntico nos transportam aos mundos da chamada Raw Art e da Outsider Art produzida por quem não tem formação artística nem qualquer intenção de expor ou comercializar a sua obra. Ele é uma daquelas pessoas que faz Arte porque não pode deixar de a fazer.

Como profissional de Educação, diria, a propósito deste resumo biográfico, que há alguns conceitos que continuam hoje a ser pouco claros e a prejudicar muito a construção dos sistemas de ensino, pondo até em causa a possibilidade do sucesso educativo. Um deles é o de inteligência, normalmente entendida de forma redutora e restrita aos domínios da linguagem e da lógico-matemática. O especialista britânico em educação artística Ken Robinson revela que a maior parte dos sistemas de ensino público, em todo o mundo, assentam neste princípio errado, esquecendo todas as demais formas de inteligência ou dando-lhes um valor e espaço muito diminutos. E isto passados já mais de 25 anos após o psicólogo cognitivo e educacional norte-americano Howard Gardner ter divulgado a sua teoria das inteligências múltiplas. Gardner identificou inicialmente sete tipos de inteligência: linguística, lógico-matemática, espacial, musical, cinestésica, interpessoal e intrapessoal (que se associam no conceito de inteligência emocional); mais recentemente, acrescentou as inteligências naturalista e existencialista.

Outro conceito por vezes também mal entendido é o de criatividade, que tantas vezes associamos apenas aos domínios artísticos, quando a criatividade pode estar ligada a qualquer das inteligências acima referidas. É fácil concluir que um bom sistema de ensino deve oferecer diversidade (com qualidade) e que cabe aos educadores/professsores identificar as inteligências específicas de cada aluno, de forma a trabalhar a sua educação de acordo com as suas necessidades e capacidades. Segundo Gardner, os seres humanos dispõem de graus variados de cada uma das inteligências e de diferentes maneiras de as combinar e organizar para resolver problemas e criar produtos.

Assim, numa consulta veterinária estarão em acção a inteligência naturalista e cinestésica. Já quando o veterinário se refugia na casa da lenha a transformar pedaços toscos de madeira em seres prodigiosos ou se perde (encontra?) entre coloridos labirintos, é a inteligência espacial que se revela. Se juntarmos a isto o facto de o veterinário ser considerado por todos os que com ele se cruzam como uma “excelente pessoa”, ressalta a sua criatividade interpessoal e emocional… E é este cruzamento único de inteligências que faz com que eu tanto admire este homem… o meu irmão Paulo Miguel.

Helena Martinho
Educadora de Infância


Ilustração: Paulo Miguel Pinheiro Martinho
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