domingo, 14 de fevereiro de 2016

Carapito-84/85 ― O Meio Imaginário

O texto que se segue faz parte do relatório  Se-Carapito-tivesse-ondas... produzido pela Educadora Helena Martinho no final de 1984/1985, ano lectivo em que trabalhou no Jardim de Infância do Carapito.


Descrevi antes o meio real das crianças de Carapito. O ambiente físico e de trabalho é tipicamente rural. Assim o é a sua paisagem e construções. As crianças dominam o espaço, que percorrem livremente... e conhecem o trabalho por participarem nele ou o observarem diariamente. Pelo que me pude aperceber, com as anteriores educadoras foi feito um trabalho de exploração do meio, focando exactamente os aspectos práticos e utilitários do mesmo: os ciclos de trabalho, sementeiras e colheitas, festas da terra, etc. Por meu lado pensei que bastaria às crianças nascer, crescer, trabalhar e viver esse quotidiano. A maioria delas está condenada a viver aqui até ao fim dos seus dias. 


Não será demais sobrecarregar estas crianças, ano após ano, com os mesmos temas que elas já conhecem bem demais? Não falo em negar o seu quotidiano. Trata-se apenas de ir arejar por outros caminhos. Percorrer outras aventuras. Redescobrir o meio através do sonho, do imaginário, sempre me seduziu. E haverá coisa que mais seduza uma criança do que o trocar as leis e regras do real, transformando-o a seu gosto? Experiências desse tipo foram acontecendo e, depois de algumas, senti que o grupo vinha diferente e que a minha relação com as crianças se tornara mais estreita, mais íntima. Os momentos em que me sinto mais realizada são exactamente aqueles em que participo na aventura do imaginário. Confundo-me com eles. Não sou mais do que um elemento no grupo e descubro lado a lado com as crianças a beleza do que está por trás do real. E assim cresce o grupo, e cresce cada um deles... e cresço eu.

Sem comentários:

Enviar um comentário