Descrevi antes o meio real das crianças de Carapito. O
ambiente físico e de trabalho é tipicamente rural. Assim o é a sua paisagem e
construções. As crianças dominam o espaço, que percorrem livremente... e
conhecem o trabalho por participarem nele ou o observarem diariamente. Pelo que
me pude aperceber, com as anteriores educadoras foi feito um trabalho de
exploração do meio, focando exactamente os aspectos práticos e utilitários do
mesmo: os ciclos de trabalho, sementeiras e colheitas, festas da terra, etc.
Por meu lado pensei que bastaria às crianças nascer, crescer, trabalhar e viver
esse quotidiano. A maioria delas está condenada a viver aqui até ao fim dos
seus dias.
Não será demais sobrecarregar estas crianças, ano após
ano, com os mesmos temas que elas já conhecem bem demais? Não falo em negar o
seu quotidiano. Trata-se apenas de ir arejar por outros caminhos. Percorrer
outras aventuras. Redescobrir o meio através do sonho, do imaginário, sempre me
seduziu. E haverá coisa que mais seduza uma criança do que o trocar as leis e
regras do real, transformando-o a seu gosto? Experiências desse tipo foram
acontecendo e, depois de algumas, senti que o grupo vinha diferente e que a
minha relação com as crianças se tornara mais estreita, mais íntima. Os
momentos em que me sinto mais realizada são exactamente aqueles em que
participo na aventura do imaginário. Confundo-me com eles. Não sou mais do que
um elemento no grupo e descubro lado a lado com as crianças a beleza do que
está por trás do real. E assim cresce o grupo, e cresce cada um deles... e
cresço eu.
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