... mas deixou-nos a sua Obra.
«Eu não escrevo para crianças. Acho que, fundamentalmente,
se escreve para si próprio. E que se fala sempre de si próprio, dos seus
desejos, dos seus medos, das suas dúvidas. (E também eu, quando digo isto, falo,
evidentemente, de mim próprio.).
Uma vez, numa escola, perguntaram-me: “Por que gostas de escrever?”. Embora eu tenha respondido: “Não sei” (e que poderia responder?), acho que foi uma pergunta inteligente. Porque quem escreve não tem que escrever por isto ou por aquilo, ou para estes ou para aqueles leitores; o escritor, a maior parte das vezes, não sabe por que escreve, e apenas que gosta, que precisa de escrever: Quando um poema principia, sabe-se lá o que ele vai dizer! Porque o poema é que fala, não é o poeta, as palavras dizem o que querem (elas é que sabem, as palavras!). Às vezes dizem mais, e outras vezes – quase sempre – menos do que o poeta queria que elas dissessem. E depois as palavras são seres volúveis: a uns leitores dizem uma coisa, a outros dizem outra coisa, e, a alguns, sobretudo àqueles que não as amam, as palavras não dizem absolutamente nada.
Por isso, o escritor (mas falamos sempre de nós, não é?), não sabe para quem escreve. Escreve para quem ame as suas palavras, e para aqueles a quem as suas palavras, por qualquer razão misteriosa, disserem alguma coisa.
Eu não escrevo para crianças; penso, sim, que alguns dos meus livros, alguns dos meus poemas (...) podem dizer alguma coisa a algumas crianças. (Embora, naturalmente, não saiba bem o quê. Tenho uma ideia, claro, mas não a certeza absoluta. Aliás, também não tenho a certeza absoluta do que seja uma criança).»
Manuel
António Pina
De que são feitos os sonhos
De que são feitos os sonhos
Sem comentários:
Enviar um comentário