sábado, 19 de janeiro de 2013

O marco do correio (ou Eles levam tudo)

Meu artigo publicado no semanário O MIRANTE em 17.Janeiro.2013 

Todos os dias os ministros dizem ao povo
Como é difícil governar. Sem os ministros
O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima.
Bertolt Brecht, in “Dificuldade de Governar”
Eles levam-nos a confiança, prejudicam a democracia. Eles prometem uma coisa hoje e fazem o contrário amanhã. Não surpreende que sejam enxovalhados quando aparecem em público. Eles entram pelas portas do fundo. Péssimo sinal que se escondam. Que não se assumam como gente crescida.
Eles levam-nos para a recessão, para o abismo. Caminhamos sem sabermos para onde vamos, e duvidamos que eles saibam. Caminhamos em longas filas, em silêncio, por enquanto... Encolhemos os ombros, porque eles nos dizem que não há alternativa. Sente-se a chantagem.
Eles levam-nos o Estado social. Os hospitais estão em dificuldade, mas eles dizem que é possível fazer omeletes sem ovos… Muitos professores das escolas públicas estão em desespero, mas eles acham que é pieguice… Entretanto, o número de pedidos de aposentação está em crescendo. Será por masoquismo que as pessoas se contentam com reformas minguadas?
Eles levam-nos as certezas de outrora. Eles desprezam contratos firmados. Eles levam-nos os subsídios estipulados por lei. As leis podem agora ser aplicadas retroactivamente? Eles levam os pensionistas a pagar mais impostos do que qualquer outro tipo de rendimento. Eles entendem que a redução da despesa pública tem de passar pelos mais desprotegidos, os que não têm voz. E dizem que o que fazem é com a consciência tranquila…
Eles levam-nos a desacreditar de intenções a longo prazo. Quem concordou com o OE-2013 veio depois dizer que o OE-2014 não pode ser o mesmo. Jogo de palavras? Eles desculpam-se que estavam numa posição difícil, que não era responsável abrir uma crise política e… que não tinham peso eleitoral suficiente para fazer melhor na coligação. Quem garante que daqui a um ano têm?
Eles levam o despautério ao ponto de afirmar que os portugueses esqueceram o mar, a agricultura e a indústria. Não é sério culpar os portugueses de se terem esquecido das pescas, da agricultura e das fábricas. Porque foram eles que levaram a esse esquecimento, desprotegendo o futuro. Foram eles que, a troco de uns euros, pagaram aos pescadores e aos lavradores para não pescarem nem lavrarem.
Eles levam o ajustamento das contas públicas para além dos limites do memorando de entendimento. Serão eles mais troikistas do que a troika? Eles parecem ignorar que se as previsões falharem, como toda a gente diz que acontecerá, a troika poderá sempre dizer-lhes: Não tivessem apertado tanto o garrote!
Eles levam tudo, eles levam tudo…. Agora até levaram o marco do correio da zona de Lisboa onde habito. Felizmente, não podem levar os melros do Largo do Leão.
Ver fotografia aqui.

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