terça-feira, 13 de novembro de 2012

A cada um seu Elemento

Meu artigo publicado no jornal
O MIRANTE, 08.Nov.2012 (aqui)

É corrente dizer que alguém “está no seu elemento“ quando essa pessoa se sente bem com o que faz e com o enquadramento em que desenvolve a sua actividade, seja ela profissional ou outra.

Curiosamente esta noção foi recentemente aprofundada por Ken Robinson num livro publicado em 2009. Segundo este autor, o conceito de Elemento envolve a «circunstância em que se reúnem as coisas que adoramos fazer e as coisas em que somos bons». Para Ken Robinson, todos nascemos com capacidades extraordinárias, portanto é essencial alimentar o talento individual e “proporcionar ambientes – nas nossas escolas, nos nossos locais de trabalho… – onde cada um se sinta inspirado a crescer criativamente”.

A vida de cada um de nós é mais gratificante quando temos a possibilidade de fazer com paixão aquilo para que somos particularmente talentosos. Mas nem sempre isto acontece ou raramente acontece. Conheço, por exemplo, um bancário que gostaria de ter sido, e poderia ter sido, animador cultural… Todavia, também acontecem acasos felizes de sinal contrário. Foi o meu caso, o que me leva a recuar no tempo.

O neutrão foi descoberto em Inglaterra quatro anos antes de eu nascer. Quando a cisão nuclear foi descoberta na Alemanha, tinha eu pouco mais de dois anos. O primeiro reactor nuclear funcionou nos Estados Unidos da América três anos depois. 

Nessa altura eu vivia no Ribatejo, mais precisamente na Chamusca, nascido de uma família humilde. É claro que nesse tempo eu nunca tinha ouvido falar de neutrões, de cisão nuclear ou de reactores nucleares. Além do mais, a vida não era fácil: por exemplo, o racionamento do açúcar obrigava-nos a adoçar o café com rebuçados ou mel, e no inverno aquecíamo-nos junto a um fogareiro alimentado com serradura.

Nestas circunstâncias, eu nunca poderia ter imaginado que a minha actividade futura seria precisamente em domínios em que o neutrão, a cisão nuclear e os reactores nucleares iam estar sempre presentes. Tudo se veio a revelar no Laboratório Nuclear de Sacavém, onde comecei a trabalhar logo após ter terminado o curso na Faculdade de Ciências de Lisboa. A finalizar uma carreira de 40 anos, tive até a sorte de participar numa descoberta relevante no âmbito da Física de Neutrões, que tem sido amplamente citada a nível internacional.

Teria eu uns 13 ou 14 anos, quando alguém (certamente com razão para estar indisposto comigo) me gritou: Tu nunca serás nada na vida! Todavia, como a vida é feita de acasos, aconteceu tudo o que era necessário acontecer para que aquela “profecia” não se concretizasse. E assim, contra tudo o que era previsível na minha infância, acabei por encontrar no neutrão o meu improvável Elemento. Não desista o leitor de procurar o seu, contra todas as dificuldades.

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