Quando me convidou para colaborar no jornal, o Joaquim
António Emídio disse-me: As pessoas estão
fartas de política. Julgo ter entendido a mensagem, e até agora não falei
de política. Mas ontem foi aprovado o Orçamento do Estado para 2013 pela
Assembleia da República (AR), que parece ser um prego mais no caixão que nos
há-de levar à cova!
Não vou
falar de política... Vou antes socorrer-me de duas pessoas para o fazerem por
mim. São testemunhos de pessoas esclarecidas que, como é desejável, pertencem a
quadrantes políticos bem diferenciados. (Fonte: PÚBLICO, 28.Nov.2012.)
> António Bagão Félix
(economista, ex-ministro das Finanças): A
grosseira inconstitucionalidade da tributação sobre pensões
«Aprovado o OE2013, Portugal arrisca-se a entrar no “Guinness Fiscal” por força de um muito provavelmente caso único no planeta: a partir de um certo valor (1350 euros mensais), os pensionistas vão passar a pagar mais impostos do que qualquer outro tipo de rendimento, incluindo o de um salário de igual montante! Um atropelo fiscal inconstitucional, pois que o imposto pessoal é progressivo em função dos rendimentos do agregado familiar (art.º 104.º da CRP) mas não em função da situação activa ou inactiva do sujeito passivo, e uma grosseira violação do princípio da igualdade (art.º 13.º da CRP). (…)
Nas
pensões, o Governo resolveu que tudo o que mexe leva! Mesmo – como é o caso –
que não esteja previsto no memorando da troika.
(…)
(…)
quando se fala em redução da despesa pública há uma concentração da discussão
sempre em torno da sustentabilidade do Estado social (…). Porque, afinal, os
seus beneficiários são os velhos, os desempregados, os doentes, os pobres, os
inválidos, os deficientes… os que não têm voz nem fazem grandes manifestações.
E porque aqui não há embaraços ou condicionantes como há com parcerias
público-privadas, escritórios de advogados, banqueiros, grupos de pressão,
estivadores. É fácil ser corajoso com quem não se pode defender. (…)»
> Rui Tavares (historiador e
eurodeputado): Da
caducidade
«Ontem, a maioria na AR aprovou um orçamento irrealista – baseado em previsões económicas nas quais ninguém acredita –, injusto – punindo especialmente os trabalhadores, os pensionistas, o cidadão comum e, em particular, os mais vulneráveis –, e iníquo – estabelecendo objectivos de desvalorização interna e, em última análise, empobrecimento, que a maioria dos portugueses recusa.
(…) dezoito deputados do PSD decidiram apresentar uma declaração de voto na qual exprimiam o seu desacordo em relação às medidas fiscais do governo [!]. Esta era uma atitude [com que] apesar de tudo descarregariam a sua consciência. Pois bem, nem isso o autoritarismo imanente da política portuguesa permitiu: o aparelho do PSD logo encontrou maneira de esvaziar o mandato daqueles deputados. Mas, evidentemente, os deputados são também os culpados: nada, a não ser a pusilanimidade, os obrigaria a aceitar este enxovalho. (…)»