quarta-feira, 11 de maio de 2011

Era uma vez um Tabu

Era uma vez um Tabu, no sultanado da Lusitânia. Rezam as crónicas que o dito cujo nasceu duma notícia do Expressius de 29 de Outubro do ano 9 DC (depois de Cavacus): «O grão-vizir pode deixar a liderança». Posta a coisa neste pé, correram a perguntar-lhe: Senhor, é verdade o que consta? Com o semblante enigmático, o grão-vizir alimentou a dúvida: Isso é um tabu. Só me pronunciarei sobre o assunto daqui a uns tempos, não antes da Primavera. Com o mistério a pairar, estava criado o Tabu.

Entretanto, o sultão da Lusitânia, de seu nome Soaris, ia cogitando: Será desta que nos veremos livres dele? Não sem que admitisse, todavia, que aquilo poderia ser um engodo, para atrair os incautos. Na verdade, muita gente pensava que a vontade do grão-vizir era fazer-de-conta que saía, para melhor ficar onde estava. Por isso houve quem dissesse que o Tabu não passava de uma enorme encenação, e até o designaram por Psicodrama. Veja-se como os seus mais próximos clamavam: Senhor! Aproximam-se grandes batalhas e nós, leais servidores da nossa causa, precisamos de saber quem é o general. Não podemos ir para a guerra sem saber quem comanda as tropas. Mas o grão-vizir... moita-carrasco! Apenas concedeu antecipar a data em que daria a conhecer a sua decisão: não seria pelo nascer da folha, mas sim antes do Entrudo... Mais tarde, o grão-vizir - que nunca se enganava e raramente tinha dúvidas - teve de antecipar ainda mais a quebra do tabu, provavelmente devido a notícias postas a circular.

Na Lusitânia havia um periódico especializado em desconfianças certas, que era um autêntico quebra-cabeças para o vizirado. Estava o Tabu a correr os seus trâmites, eis que o Independentis revela casos de corrupção inimagináveis e situações escandalosas numa empresa tutelada pelo vice-grão-vizir, que se envolvera em reparações de máquinas voadoras, com desprestígio para o sultanado. Foi um Deus-nos-acuda! Como era habitual, o vizirado não sabia de nada e, parece, tinha raiva a quem sabia... De facto, o que preocupava o grão-vizir não eram os casos em si mesmos, nem as suas consequências políticas: o importante era identificar os infiltrados que estavam na origem das más notícias e descobrir-lhes a motivação; o que havia a fazer era denunciar os anti-patriotas que punham tudo em causa, sem o respeito devido à sua governação exemplar.

Nestas circunstâncias, sob a pressão dos acontecimentos, o Tabu foi quebrado a 23 de Janeiro do ano 10 DC, de forma surpreendente. Numa curta intervenção, o grão-vizir anunciou: Tomei a decisão de não continuar. Mais adiante, acalmou os Lusitanos: Podem estar tranquilos: a recuperação económica está controlada, a inflação está controlada, o desemprego está controlado, o défice do Orçamento está controlado. E, a terminar, disponibilizou-se para continuar a trabalhar, como grão-vizir, fiel aos compromissos assumidos, que se estendem até Outubro.
O vizirado compreendeu as razões e acatou respeitosamente a decisão. Os súbditos, com aquelas coisas todas controladas, respiraram de alívio. O sultão, bem disposto - cantarolando até a canção Desta vez é que foi! - começou logo a preparar a Grande Consulta para antes dos banhos de mar, e não no cair da folha, como pretendia o futuro ex-grão-vizir.

Esta é uma história para continuar. Fique atento, leitor. É que, além da frenética movimentação provocada pela decisão do grão-vizir, há uma interrogação em suspenso que pode transformar-se num segundo tabu: Será o grão-vizir candidato a sultão? Não perca as cenas dos próximos capítulos!

Crónica publicada no jornal O MIRANTE em 31.Janeiro.1995

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