Frei Bento Domingues (Público, 7 de Janeiro de 2018)
1. Com verdade ou
maldade, ouvi repetir, desde há vários anos, que para os meios de comunicação,
sobretudo para as televisões, os incêndios representam uma bênção. Fazem subir
as audiências sem grandes custos, alimentam a morbidez pelos desastres,
intoxicam o país de irremediáveis opiniões contraditórias e paralisantes. A
visão dos nossos recursos, potencialidades e lacunas é substituída pelo
espectáculo das chamas. Resta a conversa sobre as responsabilidades do Estado,
cada vez mais diluídas e transnacionais, os interesses das empresas privadas, a
desertificação do interior e os aproveitamentos partidários de circunstância. O
reordenamento do território com a participação activa das populações é o tema
nunca esquecido e sempre adiado. As suspeitas de fogo posto e as capacidades da
lua incendiar a noite são enigmas recorrentes.
Se os meios de comunicação ajudam a fixar, em cada ano,
os bodes expiatórios de serviço, não me parece que sejam eles os responsáveis
pelo nevoeiro e escuridão que envolvem as explicações de um fenómeno que todos
confessam ser muito complexo, acumulando anos de desatenção, que, agora,
poderia ser resolvido por relatórios de alguns peritos ou por decreto
presidencial ou governamental.
Antes de entrar noutras questões não posso, no entanto,
evitar uma pergunta: querem os meios de comunicação contribuir para sarar as
feridas das vítimas ou continuar a dificultar a sua cicatrização?
Quem se mostrou pouco convencido da eficácia da repetição
das imagens da tragédia foi António Leuschner, psiquiatra e presidente da
comissão de acompanhamento, na área da saúde mental, das populações afectadas
pelos incêndios de Pedrógão Grande. Numa lúcida entrevista ao PÚBLICO
(24.12.2017), mostrou que o excesso de manifestações emocionais, em vez de
ajudar, pode dificultar a recuperação psicológica das pessoas mais afectadas.
Defende atitudes de sabedoria.
“Acho bem que as pessoas não se distanciem com frieza,
devem dar sinais de que estão solidárias. Mas o pior que pode haver para um
decisor é deixar-se afectar demasiado pela emoção, porque corre o risco de
errar. Nem oito, nem oitenta. Nem excesso de emoção nem gelo.”
Como psiquiatra, observa que, apesar de tudo, há muita gente que já deu a volta e que ninguém se
suicidou. Algumas situações mais graves foram encaminhadas para a psiquiatria.
Foram excepções.
António Leuschner pensa que a divulgação das
circunstâncias em que 64 pessoas morreram em Pedrógão pode ter mais efeitos maléficos do que benéficos. É altamente patogénica porque desperta sentimentos que não ajudam as
pessoas. Sem acusar ninguém, lembra que estar a recordar tudo passado um mês,
dois, três, quatro, cinco, seis meses, não faz bem às pessoas, não contribui em
nada para a felicidade de quem sofreu muito.
Este psiquiatra ainda está para perceber a importância da
divulgação do famoso capítulo sexto do relatório do investigador Domingos
Xavier Viegas. “Pode ter importância para a investigação, para as autoridades
judiciais, para se perceber o que correu mal, mas divulgar os detalhes...
confesso que ainda não consegui entender o que é que se ganha com isso. Receio
que tenha mais efeitos maléficos do que benéficos.” [...]
Nota final
Aqui vai uma sugestão que precisa de diferentes desenvolvimentos. Começaria por desenhar, com alertas bem visíveis, em cada lugar, um mapa que assinalasse o que é urgente e possível fazer já, ao nível da prevenção, pelas próprias populações, com a ajuda do poder local, regional ou nacional, se for o caso.
Nesta sugestão, ao referir em cada local, é para se ter, de norte a sul do país, todo o território marcado de tal forma que não se continue com a conversa fiada sobre o nosso crónico défice democrático. Como fazer?
Nota final
Aqui vai uma sugestão que precisa de diferentes desenvolvimentos. Começaria por desenhar, com alertas bem visíveis, em cada lugar, um mapa que assinalasse o que é urgente e possível fazer já, ao nível da prevenção, pelas próprias populações, com a ajuda do poder local, regional ou nacional, se for o caso.
Nesta sugestão, ao referir em cada local, é para se ter, de norte a sul do país, todo o território marcado de tal forma que não se continue com a conversa fiada sobre o nosso crónico défice democrático. Como fazer?
Voltarei ao
assunto, mas a prática para que este texto aponta não precisa de esperar.
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