“A
propósito do corte nas pensões de aposentação e... das excepções”
Luís
Reis Torgal (Professor
catedrático jubilado)
PÚBLICO,
28.Agosto.2013
«(...) Mais
uma vez este Governo prepara-se para reduzir as pensões dos aposentados da
função pública, sob pretexto de que o cálculo das pensões beneficiou sempre o
sector público em detrimento do privado, como se alguma vez tivesse dado
mostras de se preocupar com a justiça social. O que conta é o pragmatismo
neoliberal, que tanto funciona em favor do consumismo que consumiu e continua a
consumir alguns, como actua agora pela austeridade que empobrece muitos mais.
Desta vez - mais uma vez -, numa lógica de disparate absoluto que ninguém
compreende, lança cá para fora ou cria condições para que surjam notícias que
nos colocam os cabelos em pé, a ponto de nos perguntarmos se são ou não
verdadeiras. A engenharia financeira dos cortes nas pensões é complexa e,
nessas notícias desencontradas, além de se verificar a ilusão de que se
pretende salvar os mais desfavorecidos (os que ganham até 600 euros ou os que
recebem pensões de sobrevivência até 300 euros) aparece a ideia de que há
excepções nesses cortes. Fala-se ora dos magistrados e dos embaixadores, ora
dos funcionários da Caixa Geral de Depósitos, ora dos políticos que gozaram da
benesse de usufruírem de aposentações, ou subvenções, após poucos anos de
exercício dos seus cargos... Uns porque se mantêm (ou o seu estatuto os mantém
formalmente) no activo, outros porque, porventura, as contas da sua aposentação
eram diferentes, mas muitos, com certeza, porque correspondem a interesses de
classe e ao medo que esses interesses venham ao de cima e prejudiquem a paz
podre em que todos vivemos, com um Governo que - parece - já não representa
ninguém, além de alguns elementos dos partidos que nos governam, ou
desgovernam. (...)
Torno a pedir desculpa aos
leitores por ter falado de mim, dizendo apenas o que fui e o que sou, como
muitos outros podem fazê-lo, na qualidade de professores (do pré-escolar e do
ensino básico ao ensino secundário e superior) ou de funcionários públicos de
outras profissões, as mais variadas. Continuamos alguns no activo,
gratuitamente..., e muitos descontaram para a as suas pensões ao longo de muitos
anos. Todavia, este Governo com muitos ineptos e oportunistas, que todos os
dias ensaiam o espectáculo do Poder, neste país dependente, nesta Europa
burocrática e neste "mundo plano" sem controlo, brinca connosco,
considera-nos ricos, aplica-nos taxas de solidariedade (!) e pretende agora
diminuir ainda mais a nossa pensão de aposentação, não se esquecendo,
evidentemente, de algumas excepções... Este país não é para velhos, como não é
para novos. Só para alguns poucos e, por vezes, os mais medíocres.
Quousque tandem
abutere, Catilina, patientia nostra? - é famosa, e por vezes
tremendamente actual, a frase de Cícero. "Até quando, Catilina, abusarás
da nossa paciência?". Transferindo-a para os dias de hoje: até quando
este Governo ou, ainda melhor, este sistema, abusará da nossa paciência?»